quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

Pseudodemocracia racial

60% dos jovens de periferia sem antecedentes criminais já sofreram violência policial; a cada quatro pessoas mortas pela polícia, três são negras; nas universidades brasileiras apenas dois dos alunos são negros; a cada quatro horas, um jovem negro morre violentamente em São Paulo”.
“Um monte de famílias tinham ficado sem casa, por causa das enchentes e alguns incêndios criminosos. A rapaziada do Governo não brincava; não tem onde morar? Manda pra Cidade de Deus. Lá não tinha luz, não tinha asfalto, não tinha ônibus, mas pro Governo e os ricos não importava nosso problema; como eu disse, a Cidade de Deus fica muito longe do cartão postal do Rio de Janeiro”.
Citações de Mano Brown, em mais uma de suas composições, e Buscapé, protagonista do filme “Cidade de Deus”, respectivamente. Ambos referem-se aos negros na sociedade brasileira e por mais que na segunda citação não haja uma referência direta à etnia negra, é só assistirmos ao filme e logo teremos a informação. Ou, quem sabe, analisarmos o seguinte fato: segundo uma pesquisa publicada pelo IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), em 16 de dezembro de 2008, considerando a distribuição de acordo com o chefe da família, tem-se que 40,1% dessas casas são chefiadas por homens negros, 26% por mulheres negras, 21,3% por homens brancos e 11,7% por mulheres brancas. De acordo com o estudo, essa distribuição mostra a predominância da população negra em favelas, o que reforça a sua maior vulnerabilidade social. Outro ponto analisado, referente à condição de habitação da população, é o número muito grande de pessoas morando na mesma residência. Os valores são considerados baixos (5% em 2007) e vêm se reduzindo (eram 10% em 1993). Se apenas 3% dos domicílios chefiados por brancos se encontram nessa situação, entre as famílias com chefes negros o percentual mais que dobra, chegando a 7%. No que diz respeito ao acesso aos serviços básicos, a diferença etnológica é clara, somente 96,7% das famílias negras têm acesso aos serviços enquanto 99% da população branca contam com eles. No quesito esgoto sanitário a diferença é ainda mais visível, 76% das famílias negras contam com esse serviço, enquanto quase mais 15% da população branca contam com eles, totalizando 88%.
 O Relatório de Desenvolvimento Humano Brasil 2005 – Racismo, pobreza e violência. Divulgado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), o relatório contou com a participação de mais de 30 pesquisadores e fez um levantamento nas áreas de desenvolvimento humano, saúde, renda, educação, emprego, habitação e violência; com isso pôde concluir que os negros encontram-se em situação desfavorável no país.
Segundo o relatório:
Na política: há uma sub-representação deles nos setores de decisão: poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, porém o fato se repete em quaisquer áreas do setor político brasileiro; nos meios de comunicação de massa, sindicatos e associações profissionais, movimentos sociais e organizações não governamentais. Não por coincidência, pois os fatores riqueza e política estão atrelados.
Na renda: 64,1% dos pobres são negros. Apesar de os negros representarem 44,7% da população brasileira, sua participação chega a 70% entre os 10% mais pobres e entre os 10% mais ricos, eles não passam de 16%.
Na expectativa de vida: Em 2000, a expectativa de vida da população branca era de 71,5 anos, enquanto que a dos negros era de 66,2 anos. No mesmo período, a taxa de mortalidade infantil entre as crianças negras ainda era 66% maior que entre as crianças brancas (22,93). 
No mercado de trabalho: Em 2003, o salário dos homens brancos era 113% maior que o dos homens negros. O das mulheres brancas, 84% superior ao das negras.
Na educação: Em 2000, as mulheres brancas eram mais bem preparadas para o trabalho: 12% terminaram a faculdade, enquanto as negras com esse ensino eram 3,1%. A proporção de brancos com nível universitário passou de 1,8% em 1960 para 11,8% em 2000; o de negros subiu de 0,13% para 2,9%.  Em 1940, não sabiam ler nem escrever 47,2% dos brancos e 74,2% dos negros. Em 2000, 8,3% dos brancos com mais de 15 anos eram analfabetos, enquanto entre os negros esse percentual era de 18,7% (125% superior). Em 2003, das crianças que não frequentavam a escola, 67,9% eram negras.

Mesmo após tanto tempo da abolição da escravatura no Brasil, culminada em 13 de maio de 1888, me parece que a situação dos negros continua a mesma no país. As favelas surgiram pela liberação dos escravos e vinda de negros africanos ao país e sem terem onde morar construíam suas casas em terrenos baldios, deixando décadas depois para mais de milhões de herdeiros; é daí que surge a maior parte da população das comunidades ser negras.
Como consequência disso, o negro é desprivilegiado sim. Pensemos todos juntos: o negro mora na favela, tem uma renda baixa para sobreviver, tem menos acesso a uma escola de qualidade e a um ensino decente para ingressar numa faculdade bacana. Ganha menor salário do que o colega branco, simplesmente por ser negro; encontra-se em menor percentual de todos os setores, quais são possíveis fazer alguma pesquisa de quantidade. E não me venha você com aquele discursinho clichê de que “quando a gente quer, a gente vai atrás”. Responda-me: se o cara é desvalorizado e não tem chance nenhuma na vida simplesmente por ser negro e por morar numa comunidade (ou não), como é que ele vai ter motivação pra alguma coisa?
O Brasil vive uma pseudodemocracia racial desde a época onde negros eram escravos e brancos os patrões; escondem os dados para não manchar a imagem de “Brasil, um país de todos”. Todos quem? Ricos e brancos.
E você ainda está naquele discursinho antiquado de que não é a favor das cotas raciais? Por favor..


“Todo brasileiro, mesmo o alvo, de cabelo louro, traz na alma, quando não na alma e no corpo, a sombra ou pelo menos a pinta, do indígena ou do negro.” Gilberto Freyre, em Casa-grande & Senzala.  



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